Páginas

quarta-feira, 18 de maio de 2011

ADAPTAÇÃO (Adaptation, 2002)

"Está bem, mas aviso que não vai ter sexo, nem armas, nem perseguições de carros, nem personagens aprendendo grandes lições da vida, fazendo as pazes ou superando obstáculos no final. O livro não é assim e a vida não é assim". Essa é uma das falas mais interessantes de Charlie Kaufman (personagem de Nicolas Cage no filme Adaptação.

Acabei de assisitir Adaptação e, para resumir a minha impressão geral do filme, tenho que juntar os pedaços do meu cérebro espalhados pela sala. Antigamente se dizia "leia o livro, assista o filme" como o último pacote de interação com uma história. Depois de Adaptação isso se tornou "leia o livro, assista o filme, se informe sobre as pessoas envolvidas no filme". A obra rapidamente entrou para a minha lista de favoritos e, apesar de algumas poucas falhas em relação a ritmo, é simplesmente um dos roteiros mais inteligentes que eu já vi. Por um certo aspecto, a história não é tão complicada e usa o velho truque de misturar realidade com ficção, o que sempre teve um charme extra para mim.

Charlie Kaufman (Nicolas Cage) é um roteirista chamado para adaptar o livro "O Ladrão de Orquídeas" da autora Susan Orlean (Meryl Streep). O livro retrata a vida de John Laroche (Chris Cooper) um orquidófilo que foi preso enquanto retirava espécies raras de orquídeas de uma reserva natural no estado da Flórida. Kaufman está passando por uma depressão e não consegue enxergar nada de relevante na história para que ela seja adaptada para as telas. Seu irmão gêmeo irresponsável, Donald, acaba de se mudar para sua casa e decide de uma hora para outra se tornar roteirista. Enquanto Charlie tenta desesperadamente superar sua crise de bloqueio de escritor e fazer um roteiro original e criativo, Donald escreve um roteiro totalmente cheio de clichês e obtém sucesso. Charlie sofre pressões da Columbia Pictures por seu prazo ter estourado para entregar a adaptação do livro de Susan. Sem achar saída para a adaptação, Charlie põe a sua própria história junto com a adaptação e começa a escrever sobre si mesmo adaptando o livro em um filme.
Essa é apenas a ponta do iceberg, de uma trama completamente maluca, original e genial. Os pontos mais interessantes do filme não estão dentro dele e se apresentam apenas quando conhecemos a história das pessoas envolvidas no filme. O roteirista do filme é Charlie Kaufman, roteirista vencedor do Oscar e responsável por Quero Ser John Malkovich e Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças. A primeira cena do filme mostra Kaufman no set de Quero Ser John Malkovich, filme dirigido por Spike Jonze, justamente o diretor de Adaptação. Na vida real, Kaufman foi procurado pela Columbia Pictures e pediram a ele que adaptasse o livro "O Ladrão de Orquídeas" da reporter Susan Orlean do The New Yorker. Kaufman não conseguia e escreveu a história de si mesmo adaptando o roteiro. Donald Kaufman, na verdade, não existe e foi criado por Charlie como um personagem para o filme. O incrível é que ninguém sabia disso e todo o marketing do filme foi feito como se ele fosse uma pessoa real, o próprio cartaz do filme dizia "Dos roteiristas Charlie e Donald Kaufman", mas não para por aqui, Donald foi indicado ao Oscar de Melhor Roteiro Adaptado na 75º edição do Oscar.
A primeira metade do filme segue a adaptação no estilo de Charlie, de forma criativa e interessante, mas não vai a lugar algum e a história não evolui. Quando Charlie finalmente decide seguir os conselhos de seu irmão o filme acelera o ritmo e a história flui mas fica repleto de clichês e reviravoltas forçadas. Assim, a história original, apresentada em "O Ladrão de Orquídeas" é totalmente deixada de lado e Kaufman cria sua própria versão dos fatos. Essa é a primeira vez que eu vejo a falta de criatividade em si ser usada de forma criativa e a favor da história, ao invés de apenas como refúgios para o espectador mediano que já sabe o que esperar de uma ida ao cinema.

Nicolas Cage entregou sua última grande performance no papel dos gêmeos Kaufman antes de entrar em uma interminável maré de filmes medíocres, chegando a ser indicado ao Oscar de Melhor Ator pelo filme. Meryl Streep também foi indicada como Melhor Atriz Coadjuvante e Chris Cooper ganhou a estatueta como Melhor Ator Coadjuvante. Brian Cox está perfeito como o palestrante de um curso de roteiristas que aconselha Kaufman a nunca usar "narração em off", enganar o espectador com o final ou recorrer ao "deus ex machina", todos recursos que Kaufman utiliza em seu roteiro.


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...