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terça-feira, 1 de setembro de 2009

Cicatrizes.

Engraçado, eu não lembrava desse texto. Foi meu último texto no "teorias", escrei em 26/05/2007. Lendo ele hoje acho que é o único texto que poderia servir de conselho para outras pessoas que caminharam pelos mesmos caminhos que eu. Acho que é um saldo positivo, 24 anos de experiência e um conselho bom para dar...



"O quanto alguém pode sentir falta das sombras? De não estar mais a mercê das boas intenções. A mercê de sentimentos nobres. A mercê do amor. Não há qualquer tipo de ressentimento em relação a pessoa que me tornei, o maior câncer que atormenta minha alma é o que as pessoas que eu amei se tornaram. Mas não é isso que me faz perder o sono noite após noite. O que rasga minha frágil tranquilidade é o papel que eu desempenhei na queda abissal de cada uma dessas pessoas. Eu adoraria deixar minha humildade aflorar e me convencer de que eu não sou nada mais do que um transeunte na vida dessas pessoas. Mas mesmo quando todos os esforços comungam nessa direção, a tranquilidade não aparece. Confie em mim, quando a sua tranquilidade desaparece, alguma culpa você teve. Quando você é um canalha (ainda que com sentimentos) e a sua tranquilidade desaparece é por que muita culpa você teve. Leva um tempo até você perceber que ouvir músicas que evocam dor e arrependimento não fazem nada para melhorar a sua situação.
Depois de uma certa idade, você começa a ficar cansado de acumular cicatrizes, fica entediado de dedicar a sua vida a um objetivo que não traz mais do que a mera satisfação momentânea. Existem algumas que se formam quase que por brinquedo, você pensa que está experimentando por um caminho que pode voltar a hora que quiser, mas não é bem assim. Existem outras lá no ínicio, que você persegue, mesmo sabendo que irão se formar, você sabe que elas irão te transformar, te deixar mais preparado para a vida.
O que você não sabe nesse ponto é que elas jamais te deixarão. E em um certo ponto quando você tentar pôr em prática a nova vida que você sempre sonhou elas te arrastarão de volta ao ponto o qual você não quer mais estar. Elas por fim acabam definindo você. Quando se tem quinze anos pode parecer uma ótima idéia ser um conquistador, um "galinha". Cada nova mulher, ou menina, ou mãe conquistada é um troféu a ser exposto. Cada uma delas é um passo a mais na formosa trilha hedonista da satisfação. Conforme você vai envelhecendo acaba se dando conta que se transformou em alguém que perdeu partes de quem realmente era ao longo de cada um desses passos e que não tem a menor chance de voltar a ser quem gostava. Mas esse não é o ponto final. Você têm que aceitar o fato de que viverá os próximos anos aceitando essa verdade. E ainda por cima terá que ver que a sua mudança, a sua metamorfose , mudou a vida e a perspectiva de diversas pessoas ao longo do caminho, sempre para pior. Se resta algum consolo é o de que pessoas assim morrem cedo, subtraídas da vida pelo seu senso de esgotabilidade. Um senso muito apropriado por sinal , pois não se bebe da fonte da vida impunemente. Quando você se esbalda naquilo que para outros é sagrado, você mesmo sabe que merece essa punição.
Você se decepciona a cada dia que acorda pois sabe que ao respirar o ar que enche seus pulmões está trapaceando a justiça. Muitos anos se passam assim. Até que um dia você finalmente entende que a sua punição é justamente ficar esperando o golpe justiceiro que se abateria sobre você. Uma busca e sede incessantes de justiça contra seus pecados toma conta do seu ser. Pois você sabe que se for punido poderá reconhecer a imagem que tenta tão arduamente encarar quando vislumbra o espelho todas as manhãs. O maior dos pecadores acaba se tornando o mais ávido suplicante por justiça. Mas como eu disse, pessoas assim morrem jovens e já fizemos as pazes com esse destino a muito tempo. Então no fim, fica a última esperança de redenção daqueles que não ousam olhar para trás: tomar os caminhos levianos que levam aos corações desolados têm seu preço. E dele o destino não exime ninguém, não importando o quão bom você seja em se eximir de culpas. Ficam por fim duas opções: morrer cedo e se safar do peso inexorável da consciência ou definhar lentamente suas emoções e culpas enquanto aguarda pelo acerto de contas que nunca virá. "

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